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Durante muitas décadas, elas mantiveram-se, discretamente, na retaguarda dos gestores das empresas de moldes, numa indústria tradicionalmente masculina. As mulheres dedicavam-se ao trabalho administrativo, assegurando a organização dos ‘papéis’, tratando das questões mais burocráticas. Passavam despercebidas num sector onde os protagonistas, fossem produtores ou os seus clientes, eram homens. Com o passar dos anos, o seu valor começou a ser reconhecido. Passaram a ocupar outros cargos, como a área comercial. Foram dando provas de profissionalismo e dedicação, ao mesmo tempo que começaram a integrar também os cursos mais técnicos ligados à indústria. Começaram a deter conhecimento técnico e a integrar as equipas dos vários departamentos produtivos das empresas. Mas só recentemente começam a surgir, em maior quantidade, na liderança das organizações, defendendo a necessidade de criar estratégias empresariais, formativas e até políticas que tornem a indústria, e em particular a de moldes, mais atrativa à presença feminina.
Cláudia Novo (Erofio), Guida Figueiredo (Carfi) e Sónia Calado (DRT) têm em comum o facto de integrarem a gestão das respetivas empresas. As três fazem também parte da Rede Mulher Líder, criada em 2016, pelo IAPMEI, e recentemente elevada ao estatuto de Associação.
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Apesar de hoje estarem na liderança, os seus percursos foram diferentes até aí chegarem. Enquanto Sónia Calado é administradora e fundadora da DRT, Cláudia Novo e Guida Figueiredo são os rostos da nova geração na sucessão das empresas.
Sónia Calado conta ter entrado no mundo dos moldes através daquilo que considera como “um ato de quase inconsciência da juventude”. Tinha então 23 anos e, juntamente com o marido, decidiu criar a empresa. “Ele tinha o conhecimento técnico, tinha os clientes. Mas não tinha conhecimento de gestão, nem da parte contabilística ou administrativa e eu estava no último ano do curso de gestão”, recorda. E assim começou o projeto que é, hoje, um grupo empresarial.
Sónia Calado
“Ser mulher naquelas funções era, na época, novidade no sector. E, aos 23 anos, era difícil conseguir transmitir confiança, quer junto dos fornecedores, quer sobretudo junto da banca. Ainda por cima, estávamos num sector de grande exigência que era a indústria automóvel. Mas evoluímos muito rápido e com o crescimento da empresa, deixei de notar isso. Para a indústria, deixámos de ser os miúdos que vinham brincar aos moldes e passámos a ser os profissionais que faziam bem”, relata. Mas, adianta, “ainda demorou algum tempo até deixar de sentir que, em muitas reuniões, fosse na empresa, fosse em instituições, era a única mulher no meio de dezenas de homens”. E hoje, apesar de não sentir isso, admite que se trata de um sector “maioritariamente masculino”.
Já Cláudia Novo, considera que a sua ligação com a empresa existe desde sempre: “fui crescendo na empresa”. “Desde os 14 ou 15 anos que vou à empresa, com o meu pai. Sempre fui ajudar nas férias e senti que fazia parte”, conta. De tal forma que decidiu estudar em Leiria, para ir acompanhando o trabalho diário da empresa.
A sua integração foi, por isso, um processo muito natural. “Era uma empresa pequena e todas as ajudas eram muito importantes”. Passou por todas as áreas, mas sobretudo a financeira e também de gestão de pessoas e, dessa forma, desenvolveu o seu conhecimento sobre a atividade. Acabou por assumir o cargo de diretora financeira.
Entretanto, a empresa cresceu, surgiram outras áreas de negócio e entrou como sócia para a unidade de plásticos. E finalmente, passou a administradora das empresas do grupo.
Cláudia Novo
Tendo entrado desta forma, Cláudia assegura nunca ter sentido nenhum tipo de reação mais hostil ou adversa à sua presença. “As pessoas sempre me conheceram na empresa”, diz. Mas admite ter ouvido, por vezes, a expressão ‘filha do dono da empresa’, encarando isso como “uma responsabilidade acrescida, uma vez que tinha de consolidar a imagem do meu pai”. “Talvez se fosse homem não tivesse de provar tanto, porque parece mais natural à indústria a sucessão ser assegurada por um homem”, afirma, considerando que “quando somos mulheres, temos, por vezes, de pôr o triplo das nossas capacidades nas funções para que confiem”.
“Há este estigma na nossa indústria. Temos os primeiros empresários que estão a fazer a passagem para a segunda geração, mas, se o sucessor é uma mulher, a sua competência é questionada. Quando o sucessor é homem sente-se menos isso”, afirma.
Guida Figueiredo sente de outra forma a questão da confiança na sucessão, talvez mais relacionada com a idade e experiência. “Não me parece que seja uma questão de género, mas de desconfiança por ser alguém mais jovem, com pouca experiência”, sustenta.
Começou a sua vida profissional na Carfi na área de recursos humanos, depois do curso de psicologia das organizações e do trabalho. “Foi bom ter começado por aí porque me permitiu conhecer todo o pessoal e a dinâmica da empresa”, conta, adiantando que, depois, caminhou naturalmente para outra área. “Como tinha alguma facilidade de comunicação e gostava da parte comercial, fui por aí. E aí senti que tinha de dar mais, de provar mais alguma coisa. Mas por uma questão de competência pessoal porque não tinha experiência técnica e, por isso, tive de complementá-la com outras valências para conseguir seguir a estratégia que defini, desde o princípio, e que tinha a ver com uma maior diversificação de clientes por áreas”, explica.
Guida Figueiredo
E adianta que, para si, “nunca foi uma questão de género, mas sim de capacidade de resposta. Por isso, fiz-me sempre acompanhar de pessoal mais técnico para assegurar a melhor resposta sempre que era preciso”. Passado algum tempo, acabou por integrar a administração do grupo empresarial, fundado pelo pai.
No seu entender, “a competência vê-se pela capacidade de comunicação com a equipa e a forma de alcançar os objetivos e não por uma questão de género ou de ser da primeira ou segunda geração da gestão”.
Sónia Calado não tem dúvidas de que a sua vida profissional na indústria de moldes tem sido “uma aprendizagem constante”. “Nunca fiz outra coisa na vida, por isso não tenho ponto de comparação, mas destaco que, diariamente, esta indústria obriga-me a estar sempre atualizada e ter muita disciplina e rigor”, afirma, contando, em jeito de brincadeira, que é muito diferente da profissão que sonhava abraçar na adolescência: ser professora de aeróbica.
Para Guida Figueiredo, “qualquer profissão liga a pessoa à realidade. E esta ligou-me à sua realidade: do que são as pessoas, da sua dinâmica, da sua interação, do que é o mercado e da sua exigência”. E esta ligação, salienta, “tem a vantagem de me mostrar uma realidade mais internacional, conhecer e aprender com outras culturas”.
Já Cláudia Novo considera que a indústria de moldes lhe trouxe “uma aprendizagem constante, adaptação ao dia a dia e a novas situações e a capacidade de reatividade que temos de ter para fazer um bom trabalho”.